A iniciativa tem a curadoria de Paula Borghi e conta com obras de 18 artistas nacionais e internacionais
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O FONTE, ateliê coletivo e espaço para exposições localizado em Pinheiros, recebe nova mostra a partir do dia 27 de julho (sábado). A exposição ‘A Fonte deságua na Floresta’ toma como ponto de partida a interdependência entre água e floresta enquanto metáfora para a rede que se forma entre os projetos artísticos Fonte e Biblioteca-Floresta.
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Celebrando os 10 anos do FONTE, a curadoria selecionou 18 artistas com histórico de ateliê ou residência em ambos os espaços, nacionais e internacionais, em uma ampla cartografia. O grupo de artistas aqui envolvidos desafia a “monocultura da mente”, propondo uma policultura que se traduz em iniciativas como exposições coletivas, residências artísticas, compartilhamento de ateliês, festividades e apoio mútuo. Esse impulso criativo não apenas preserva, mas também exalta a essência experimental do fazer artístico frente às adversidades do mundo contemporâneo.
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Contemplando linguagens diversas como fotografia, pintura, vídeo, performance, instalação e objeto, as obras expostas discorrem sobre as complexas relações entre modernidade, questões socioambientais, colonização, espiritualidade e a urgente necessidade de sonhar a floresta. Destaca-se, assim, a importância do convívio comunitário e do respeito com todos os existentes para a preservação dos ciclos da água, da vida e da arte.
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A mostra também conta com um Programa Público gratuito. No dia 10 de agosto às 17h30 será apresentada uma performance inédita da artista Selva de Carvalho em colaboração com Rais Scarton, artista do corpo e da dança, e Lorena Hollander, musicista. Já no dia 16, sexta, às 19h30 acontece o lançamento do livro “Lunação” (Editora Biblioteca-Floresta) com encontro performático e bate papo com a autora Faetusa Tirzah.
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Serviço:
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FONTE
Rua Mourato Coelho, 751
Abertura, sábado, 27/07 das 14:30 às 18:30
Visitação 01/08 a 30/08
Quintas e sextas das 14h às 19h
Sábados das 11h às 17h
Informações: https://www.instagram.com/residenciafonte/ / https://font-e.org/
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Artistas:
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Adrian Balseca (Equador)
André Felipe Cardoso (Minaçu-GO)
Ariel Cusnir (Argentina)
Camila Bardehle (Chile)
Dudx (Campinas-SP)
Juliana Cerqueira Leite (SP-NY)
Marcelo Amorim (Goiania-GO)
Marcelo Brasiliense (Belo Horizonte-MG)
Martin Lanezan (Argentina)
Merv Espina (Filipinas)
Nino Cais (São Paulo-SP)
Pilar Quinteros (Chile)
Rodrigo Braga (Manaus-AM)
Sandra Gamarra (Peru)
Saulo Szabo (Rio de Janeiro-RJ)
Selva de Carvalho (São Paulo-SP)
Simone Moraes (Ribeirão Preto-SP)
Zé Tepedino (Rio de Janeiro-RJ)
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Texto Curatorial:
A fonte deságua na floresta
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Quem não se lembra da aula de ciência sobre o ciclo da água? Sobre a troca contínua de água na hidrosfera, entre a atmosfera, as águas do solo, superficiais, subterrâneas e florestais? Compreendendo que para se ter água é preciso de floresta e vice-versa, é possível imaginarmos que o Fonte e a Biblioteca-Floresta estão juntes biologicamente. E foi justamente ao encontro deste ciclo que a presente mostra propõe potencializar as relações entre estes dois projetos artísticos, com objetivo de deixar sua união cada vez mais forte.
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A respeito dessa troca que há entre o Fonte e a Biblioteca-Floresta, é preciso mencionar que ela segue num fluxo contínuo e cultivando a policultura dos sujeitos, das experiências e dos pensamentos. Pois, diferentemente de uma “monocultura da mente” cuja essência atua enquanto ferramenta de poder, acumulação e controle da vida, inspirada nas ideias da filósofa e ativista indiana Vandana Shiva, a policultura visa o oposto. Ou seja, tratam-se de projetos de arte que semeiam o convívio em coletividade e o fazer compartilhado, que acima de tudo fazem com que não esqueçamos que é preciso do outro para se viver; humanos e não-humanos.
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E por mais que o mercado de arte insista na monocultura – apostando continuamente na “monopintura”, substituindo rapidamente uma tendência artística por outra e estocando em grandes “silos” artistas para quiçá serem “resgatados” quando estiverem à beira da morte – ainda assim há uma movida artística que se une num exercício de liberdade: organizando exposições coletivas, festividades, residências artísticas, plantando árvores, compartilhando ateliês, cozinhando junto e sobretudo escutando e incentivando uns aos outros. Nota-se aqui uma sede em fazer arte tão grande que é capaz de manter a fonte cristalina e a floresta de pé, mesmo diante de tantas adversidades.
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Assim, impulsionada pela ideia de policultura inerente a estes dois projetos artísticos, a curadoria partiu de um recorte de artistas que têm ou tiveram ateliê no Fonte e sobretudo de artistas que realizaram residências/imersões no Fonte e/ou na Biblioteca-Floresta, reunindo uma cartografia ampla de territorialidades que por ali passaram ao longo destes dez anos. Em continuidade, foram selecionadas obras com linguagens variadas e que dialogam de forma direta com o tema da natureza e/ou da coletividade, enfatizando a diversidade das materialidades artísticas, dos meios de se produzir e de se pensar arte na contemporaneidade.
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Adrián Balseca (artista equatoriano que esteve em residência no Fonte em 2015) desenvolve uma pesquisa que relaciona o mito de modernidade, questões socioambientais e dinâmicas extrativistas. Para a ocasião, o artista planta uma árvore de pau-brasil dentro de uma lata de petróleo, apontando para o uso de elementos naturais manipulados enquanto commodities e problematizando o lema nacional de “progresso” a qualquer custo. Em diálogo, Rodrigo Braga (artista manauara que esteve em residência no Fonte em 2015) apresenta duas fotografias que podem ser interpretadas pelo carvão enquanto elemento chave da industrialização e o vermelho como sangue da força de trabalho.
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Em continuidade a percepção do sangue derramado sobre a terra, Merv Espina (artista filipino que esteve em residência no Fonte em 2023) apresenta uma peça visual e sonora que discorre o nome de ambientalistas assassinados no Brasil e nas Filipinas no ano passado. Enquanto isso, Sandra Gamarra (artista peruana que esteve em residência no Fonte em 2017) se dedica a uma investigação conceitual que se relaciona diretamente com a colonização na América. Com duas pinturas produzidas durante sua residência, a artista assimila e utiliza imagens de paisagens brasileiras e peruanas encontradas em circulação na imprensa com frases que remetem à exploração dos povos indígenas e de seus territórios.
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Debruçando-se sobre o conceito de animismo, Dudx (artista campinense que esteve em residência no Fonte em 2018) dá corpo a seres ficcionais, híbridos e encantados, seja por meio da pintura ou da escultura. Em vivo diálogo, Selva Carvalho (artista paulistana que esteve em residência no Fonte em 2022 e se estabeleceu com um ateliê no mesmo até o momento presente) materializa por meio da escultura e de sua ativação performática a relação entre humanos e não-humanos. São artistas que cantam e dançam, que compreendem a espiritualidade e a alegria como fenômenos emanados pela força da natureza, como bem se observa em seus trabalhos.
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Sensível a esta energia misteriosa, Marcelo Brasiliense (artista belo-horizontino que esteve em residência no Fonte de 2021-2024) expõe uma série de objetos mágicos e amuletos produzidos com elementos naturais, como se estes fossem capazes de evocar cura e proteção espiritual por onde quer que passem. São objetos para serem carregados nas mãos, assim como os de André Felipe Cardoso (artista de Minaçu que esteve em residência no Fonte em 2022): uma caixa de fósforo, um livro e um pedaço de arenito sobre um tamborete de madeira e a capa de um álbum de fotografia. Nota-se aqui a presença do cerrado, mais especificamente do Quilombo Alto Santa onde o artista vive, seja como imagem representada ou na própria materialidade.
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A presença deste bioma também se encontra no vídeo de Simone Moraes (artista ribeirão-pretense, fundadora do Fonte e da Biblioteca-Floresta), que registra uma ação em que ela demarca com seu próprio corpo uma célula de plantio de árvores do cerrado e de si mesma, para ser realizado após a artista completar sua passagem pela Terra. Nota-se aqui uma relação entre o corpo e a paisagem que também se faz presente nas esculturas de Juliana Cerqueira Leite (artista paulistana que esteve em residência no Fonte em 2021), que remetem ao espaço interno de um corpo humano em decomposição sobre terrários. Como se ambas as artistas dissessem: “Da terra viemos e para ela voltaremos”.
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A terra enquanto elemento base para este ciclo segue pulsante nas obras de Marcelo Amorim (artista goianense e fundador do Fonte) e Saulo Szábo (artista carioca que teve ateliê no Fonte em 2023), cujos trabalhos aqui presentes foram desenvolvidos a partir de uma imersão artística em junho deste ano na Biblioteca-Floresta. Estas obras, bem como a de Simone Moraes, foram idealizadas especialmente para esta exposição e trazem para o Fonte uma dimensão visual, conceitual e material da Biblioteca-Floresta, aproximando ainda mais estes dois projetos artísticos.
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Marcelo Amorim projeta um vídeo em que corre atrás do inalcançável em meio a uma “fumaça de terra”, superando sua própria exaustão num embate silencioso dele mesmo com ele próprio. Enquanto isso, Saulo Szábo apresenta uma instalação com trouxas de terra coletada no solo da Biblioteca-Floresta que se encontram em decantação para virarem argila, num processo que une os ciclos da água e da terra. São trabalhos que evocam a terra como matéria capaz de moldar os sujeitos, os caminhos a serem percorridos e toda uma cultura material que acompanha a humanidade desde seus primórdios até o presente.
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Em paralelo, Martin Lanezan (artista argentino que esteve em residência no Fonte em 2014) apresenta pinturas que combinam seres elementares com personagens camponesas, como se suas figuras fossem guardiões da fauna e da flora por mais fictícias que sejam. São imagens que conversam com os viajantes presentes nas fotografias de Nino Cais (artista paulistano e fundador do Fonte), que são capazes de dar a volta ao mundo sem sair de casa. Com seus rostos cobertos, os viajantes voam em tapetes mágicos e passeiam por jardins secretos, sempre descalços, vestindo indumentárias exóticas e carregando objetos domésticos como se fossem preciosidades.
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Esta pulsão ficcional reverbera também no vídeo de Pilar Quinteros (artista chilena que esteve em residência no Fonte em 2017), em que a partir de uma orquídea de papel em tamanho monumental narra reflexões baseadas em histórias locais sobre espécies estrangeiras introduzidas na Patagônia para fins comerciais e espécies endógenas confrontadas e forçadas a coexistir. Também imerso no tema da paisagem, Ariel Cusnir (artista argentino que esteve em residência no Fonte em 2018) apresenta uma pintura de um dia de verão, retratando um grupo de pessoas que se divertem num banho de rio ao passo que suas imagens se mesclam no reflexo esverdeado da água.
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A presença da água enquanto demarcador territorial fica ainda mais latente nos trabalhos de Camila Bardehle (artista chilena com ateliê no Fonte desde 2022) e de Zé Tepedino (artista carioca que esteve em residência no Fonte em 2021), que respectivamente trazem os oceanos Pacífico e Atlântico para as paredes pivotantes do espaço expositivo. É com este encontro simbólico das águas salgadas que a mostra conecta o mar de Valparaíso com o do Rio de Janeiro, rompendo fronteiras e aproximando regiões por meio de um azul profundo que a tudo conecta.
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Uma vez mais a água, elemento essencial à vida de todos os existentes terrestres, retorna para evocar os ciclos da água, da terra, da vida e da arte presentes em A Fonte deságua na Floresta. Tal qual um ritual realizado com muito afeto envolvido, a mostra celebra o aniversário de uma década do Fonte, marca o fim de um ciclo e o início de outro. É uma exposição que deseja vida longa ao Fonte, à Biblioteca-Floresta e aos demais projetos artísticos que estão por vir, como quem diz em voz alta que arte só existe quando compartilhada; melhor ainda quando compartilhada na companhia daqueles que amamos.
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By Patrícia Dornelas
Imagem: Créditos Martin Lanezan
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