Designer paulistana transforma duas décadas de experiência cenográfi ca em objetos que dialogam com a cultura afro-brasileira e a alta tecnologia
Depois de mais de vinte anos criando cenários e ambientes como designer de interiores, Bete Said decidiu, em 2023, dar um passo audacioso: começar a desenhar seus próprios objetos e mobiliários. A transição não foi casual, mas resultado de um amadurecimento criativo que a levou a questionar os limites de sua própria expressão artística.
“Sentia que havia algo mais profundo que eu precisava comunicar através do design”, explica Bete. “A cenografi a me ensinou sobre narrativa, sobre como os objetos contam histórias e criam atmosferas. Agora queria contar minhas próprias histórias, falar sobre quem somos como brasileiros.”
Essa busca por uma linguagem autoral se materializa de forma marcante em suas primeiras coleções. A linha Ilê Aiyê e a coleção Nagô não são apenas exercícios estéticos, mas manifestos culturais que colocam a ancestralidade afro-brasileira no centro do design contemporâneo.
Raízes que Transcendem Fronteiras
Para o público europeu, acostumado ao minimalismo nórdico e à funcionalidade alemã, o trabalho de Bete Said representa uma alternativa, com alma. “O design afro-brasileiro carrega uma potência simbólica única”, afi rma a designer. “Não se trata apenas de formas ou cores, mas de uma cosmogonia complexa que dialoga com questões universais: espiritualidade, comunidade, relação com a natureza.”
A coleção Nagô, apresentada durante a Semana de Design de Milão, mostra como essa linguagem cultural específi ca, pode dialogar com o cenário internacional. Os vasos da linha Ilê Aiyê, esculpidos artesanalmente em pedra sabão por artesãos brasileiros, despertaram curiosidade e admiração entre curadores e colecionadores italianos.
Materialidade Consciente
A escolha por trabalhar exclusivamente com materiais naturais brasileiros – pedra sabão, imbuia, couro – não é apenas uma questão estética, mas fi losófi ca. “Cada material carrega a memória do território onde nasceu”, explica a designer. “A pedra sabão de Minas Gerais tem uma história de centenas de anos, passou pelas mãos de gerações de artesãos. Isso não se reproduz artifi cialmente.”
Para Bete, trata-se de valorizar cadeias produtivas locais e manter vivas técnicas artesanais que correm o risco de desaparecer. “Quando encomendo uma peça em pedra sabão, estou colaborando com famílias inteiras em Minas Gerais. É design com impacto social real.”
Tradição e Futuro em Harmonia
O contraste mais fascinante no trabalho de Bete Said talvez seja a coexistência harmoniosa entre o artesanal ancestral e a alta tecnologia. Enquanto os vasos Ilê Aiyê são esculpidos à mão, seguindo técnicas seculares, o espelho Ojo integra carregamento wireless, iluminação inteligente e sensores de última geração.
“Não vejo contradição nisso”, esclarece a designer. “A tecnologia deve servir à vida, assim como a tradição. O espelho Ojo responde às necessidades de quem vive em apartamentos pequenos, precisa otimizar espaços, vive conectado. Mas mantém a sensibilidade brasileira no desenho, na escolha dos materiais.”
O espelho Ojo, aliás, já conquistou reconhecimento no Brasil, vencedor do prêmio Salão de Gramadode Design, e desperta interesse no mercado internacional. Sua concepção partiu de uma observação simples: “Percebi que as pessoas passavam cada vez mais tempo se arrumando em frente ao espelho, mas os espelhos continuavam os mesmos de décadas atrás. Era hora de reimaginar esse objeto.”
O Essencial é Sentir
A mais recente coleção de Bete Said tem um nome que resume sua fi losofi a: “O Essencial é Sentir”. Em um mundo saturado de objetos funcionais frios, a designer propõe uma reconexão emocional com o design.
“Quero que as pessoas sintam algo quando tocam minhas peças”, explica. “Pode ser acolhimento, curiosidade, mesmo estranhamento. Mas que sintam. O design não pode ser apenas bonito ou funcional, precisa criar vínculos afetivos.”
Processo de Criação Colaborativa
O nascimento de uma peça como os vasos Ilê Aiyê revela um processo criativo que valoriza tanto a conceituação quanto a execução artesanal. “Começo sempre com pesquisa histórica e simbólica”, explica Bete. “Para a linha Ilê Aiyê, estudei por meses as culturas iorubá e nagô, conversei com pesquisadores, visitei terreiros.”
A partir dessa imersão cultural, vem o desenho, sempre desenvolvido em diálogo com os artesãos que executarão a peça. “Não imposto uma forma. Proponho uma direção e deixo que a experiência do artesão contribua. Às vezes ele sugere uma curva diferente, uma proporção que funciona melhor com o material. Esse diálogo é fundamental.”
Design Brasileiro em Transformação
Para Bete Said, o design brasileiro vive um momento único de autoconhecimento e projeção internacional. “Por décadas, fomos infl uenciados pelo design europeu e americano. Agora estamos descobrindo nossa própria linguagem”, analisa.
“Temos uma riqueza cultural ímpar, uma diversidade de materiais naturais, tradições artesanais vivas. São diferenciais competitivos enormes no cenário mundial”, complementa. “O desafi o é comunicar essa riqueza de forma contemporânea, sem folclorização.”
A receptividade internacional às suas peças confi rma essa percepção. “Em Milão, percebi que há uma sede por narrativas autênticas, por objetos que carreguem história genuína. O design brasileiro tem muito a oferecer nesse sentido.”
Horizontes Futuros
Os próximos passos de Bete Said incluem a expansão internacional e o desenvolvimento de novas linhas que explorem outras facetas da cultura brasileira. “Quero investigar a cultura cabocla da Amazônia, as tradições gaúchas, a cerâmica do Vale do Jequitinhonha”, revela.
“Mas sem pressa. Cada coleção precisa de tempo para amadurecer, para que eu compreenda profundamente o universo cultural que estou traduzindo em objetos.”
A designer também planeja parcerias com instituições culturais brasileiras para documentar e preservar técnicas artesanais. “O design pode ser uma ferramenta poderosa de preservação cultural. É uma responsabilidade que levo muito a sério.”
Bete Said parece ter encontrado na criação de objetos autorais não apenas uma nova carreira, mas uma forma de contribuir para a construção de uma identidade visual brasileira contemporânea. Seus objetos funcionam como embaixadores culturais, levando ao mundo não apenas a estética, mas os valores e a cosmovisão do Brasil.
“Cada peça que crio é uma pequena ponte entre o Brasil profundo e o mundo globalizado”, resume. “É minha forma de dizer: estamos aqui, temos muito a oferecer, e nossa contribuição ao design mundial está apenas começando.”
By Serpa Comunicação
Foto: Divulgação
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