Segundo especialista Caio Esteves, escritor do primeiro livro sobre place branding do País, o isolamento social deve acentuar nas pessoas o senso de pertencimento. Bairros pensados com essa finalidade são considerados as moradias do futuro
Nos últimos meses, diante de um cenário de pandemia, parte da população mundial se viu obrigada ao confinamento. Cenas comoventes de pessoas em suas sacadas promovendo interação social à distância com o vizinho povoaram os telejornais e evidenciou o quanto o ser humano, em sua essência, é relacional e precisa da conexão com o outro e do convívio em comunidade.
“O mundo é cíclico, e a comunidade do futuro é a comunidade do passado atualizada”. A frase é do especialista, Caio Esteves, escritor do primeiro livro sobre place branding do País e fundador da consultoria Places for Us. Ele explica que a necessidade de pertencer a uma comunidade deverá se fortalecer depois da experiência do confinamento.
O senso de pertencimento está relacionado à necessidade do ser humano em estar conectado ao lugar onde vive. “É o que nos faz gostar mais de um lugar que de outro. São características distintivas e claras que atraem pessoas do mundo todo: visitantes, moradores, talentos e investidores”, detalha Esteves.
O movimento vem na direção contrária do crescimento dos grandes centros. Na medida em que eles foram ocupados e verticalizados, os relacionamentos comunitários acabaram sendo negligenciados, tanto em razão da vida agitada da vida moderna quanto da distribuição espacial dos moradores das cidades. Com a vida em andares, mal se encontra o vizinho no elevador. Os encontros na porta de casa foram acabando já que cada qual sai no seu veículo.
A abordagem chamada place branding ainda é um conceito pouco disseminado no Brasil, mas deve ganhar força com esse novo momento mundial. Ele se integra ao movimento do Novo Urbanismo, nascido nos anos 1980 nos Estados Unidos, para resgatar a qualidade de vida e melhorar o relacionamento entre o homem e a cidade. Na prática, projetos do Novo Urbanismo buscam mecanismos urbanos para se incentivar a mobilidade, o caminhar, o trabalho perto de casa e os espaços de convivência.
“É um lugar onde se pode viver, aprender, estudar, trabalhar em uma rede que cria uma relação entre seus moradores. Numa centralidade, você conhece o empresário, padeiro e o dono do mercadinho, porque eles também são seus vizinhos e amigos”.
Caio lembra que a tecnologia, que foi mais impulsionada nos dias de pandemia, também continuará influenciando a movimentação diária das pessoas. “Um aprendizado do isolamento social, está justamente no entendimento de que não é preciso sair às ruas. A tecnologia está a disposição e tudo pode ser entregue em casa. Isso torna o ato de sair de casa mais extraordinário. O espaço público deixa de ser o caminho para ser o destino”.
Exemplos
Embora ainda esteja começando no Brasil, o país já coleciona experiências bem sucedidas de comunidades desenvolvidas com o estímulo do senso de pertencimento. Um exemplo é o bairro Pedra Branca, localizado em Palhoça, na Grande Florianópolis (SC). Ancorado na Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), foi criado no final da década de 1990 com a meta de ser um bairro que oferecesse moradias, comércio, serviços, lazer, trabalho e educação, a distâncias confortáveis para serem percorridas à pé ou de bicicleta. O bairro-cidade possui um total 2300 lotes, em cerca de 250 hectares para abrigar para 40.000 moradores, 30.000 empregos e 10.000 estudantes.
Em Goiânia, o Grupo Toctao também está desenvolvendo uma solução dentro deste mesmo conceito, o Plateou d’Or, que está sendo construído em área de 1,6 milhões de metros quadrados, às margens da GO 020. O empreendimento será um condomínio horizontal com um Hub Humano que contemplará uma rede de serviços e lazer que vai atender toda a região, concentra cerca de 230 mil pessoas, principalmente em condomínios horizontais.
Projetado pelo premiado escritório inglês de arquitetura Broadway Malyan, ele traz conceitos urbanístico de walkability, que busca estimular a caminhada agradável em espaços especialmente planejados para isso, e o placemaking, que propõe um processo de planejamento, criação e gestão de espaço totalmente voltado para as pessoas, visando uma maior interação entre elas e o próprio meio, e transformando pontos de encontro de uma comunidade (parques, praças, ruas e calçadas) em lugares mais agradáveis e atrativos.
Na parte externa ao condomínio, o Hub Humano terá uma área de 185 mil metros. O espaço será dividido em 10 quadras e atenderá a cinco pilares importantes para a qualidade de vida: saúde, serviços, comércio, cultura e educação. “Será possível uma criança sair de dentro de sua casa, no condomínio, e chegar à escola à pé, sem atravessar uma rua”, explica Paulo Toledo, diretor da Cia Inteligência Imobiliária e coordenador de vendas do empreendimento.
A proposta, diz ele, é tirar as pessoas de dentro dos seus muros e oferecer a elas a oportunidade de viver e conviver no mesmo lugar, e a poucos passos de casa, e atender a um anseio da sociedade, que busca uma atmosfera que oferece o clima de comunidade, como não se vê mais nos grandes centros, onde as pessoas ficam reclusas ao ambiente de suas residências. “É como retornar ao interior nos tempos em que se passeava pelo bairro e se dedicava um tempo às conversas com os vizinhos. Em Goiás, isso é ainda mais forte, pois os goianos têm uma forte ligação com a terra”, diz.
Para Caio Esteve, projetos assim relembra cidades antigas como Londres e ainda cidades de países como Itália e França, onde se tem prazer em andar pelas ruas largas e contemplar a paisagem. “É para essa realidade que as comunidades do futuro devem ‘voltar”, explica Esteves.
Por Lorena Lázaro
Imagem: Divulgação